O MARUJO
Altino Farias*
Moreno claro, corpanzil avantajado, gordo tipo
socado. Olhos apertados, parecia sem pescoço por conta de uma manta de gordura
que o envolvia. Cabelos pretos, escorridos e ralos, desciam até o meio da
testa. Se o visual impressionava, seu sorriso fácil e franco cuidava de
dissipar qualquer erro de avaliação.
Calorento
e bonachão, costumava descansar nos começos de tarde numa espreguiçadeira
gentilmente posta na calçada do bar pelo proprietário do mesmo, onde ele tirava
uns cochilos alheio ao calor, ao barulho e às brincadeiras da turma que
frequentava a casa.
Toda tarde, quase pontualmente às três horas,
passava em frente ao bar uma garota que trabalhava num restaurante sef
service que funcionava na esquina. Com seus viçosos dezoito aninhos,
distribuía simpatia e simplicidade no trajeto do trabalho à parada do coletivo.
Alguns marmanjos a viam com malícia, outros com um desejo ingênuo e contido. E
eis a grande dúvida da turma: seria ele ingênua de fato ou insinuante e
oferecida?
Nosso amigo bonachão era o mais agraciado
pelos sorrisos e olhares dúbios da encantadora moça. Isso porque era o único a
ali estar todos os dias que Deus deu. Muitas vezes só ele e ela, como se
cúmplices fossem. Com o tempo, a ideia de que a garota estava a fim dele foi se
consolidando. Ao comentar suas suspeitas com a turma, encorajaram-no a partir
para cima dela e resolver a parada: “Tá na cara que ela tá na tua!”,
disseram-lhe. Ah, essa turma!
Certa tarde, uma sombra boa, uma brisa fresca,
e lá vem ela. Sem mais ninguém como testemunha, nosso garanhão deu o bote
fatal. Ela esgueirou-se, reagiu, dissimulou e se saiu da mesma forma que sempre
agira: sedutora, ingênua... Sempre dúbia, deixando nosso amigo a ver navios.
Tarde seguinte, bar lotado, turma reunida na
calçada. Quase três horas e lá vem ela mais uma vez. Sorriso discreto, roupinha
simples, na mesma simpatia enigmática de sempre. Ao cruzar caminho com o
garanhão, que descansava no sossego de sua espreguiçadeira, recolhido à sua
insignificância, ela o cumprimentou:
– Olá, marujo.
– Marujo? Marujo por que? – quis saber ele,
surpreso com o apelido inesperado.
– Porque entrou na onda! – respondeu ela, sem
alterar o passo, nem se importar com as gargalhadas da turma.
COMENTÁRIO:
Genial, Dr. Altino!
Além da graça e do
charme narrativo, pegou todo mundo até o fim. Eu, por exemplo, pensava que era
uma "moça", era, porém uma moça mesmo. Admito o epíteto de marujo,
entrei, também, na onda.
Puxa, nessa idade,
com problemas de D.N.A.!
Parabéns.
(D.N.A. = data de nascimento antiga)
(D.N.A. = data de nascimento antiga)
Vianney Mesquita
Genial, Dr. Altino!
ResponderExcluirAlém da graça e do charme narrativo, pegou todo mundo até o fim. Eu, por exemplo, pensava que era uma "moça", era, porém uma moça mesmo. Admito o epíteto de marujo, entrei, também, na onda.
Puxa, nessa idade, com problemas de D.N.A.!
Parabéns.
(D.N.A. = data de nascimento antiga)
Vianney Mesquita